domingo, 20 de fevereiro de 2011

Ansuzgardaraiwô II

Com dias e dias de viagem em seus corpos, a caravana finalmente consegue ver algo capaz de reluzir no escuro agradável das árvores. Uma luz aumenta sua ansiedade. Uma não, várias luzes. Aquilo que parecia ser uma aldeia, em meio à uma grande clareira, lançava seus pontos de luz nos olhos dos viajantes, deixando-os apreensivos, fazendo com que se entreolhassem, antes de seguir andando, descendo para aquela vila. Os corações batendo forte, as almas alegres. Os aldeões que os avistam convidam outros a amontoarem-se para assistir à chegada daqueles desconhecidos que, pelo visto, seriam bem recebidos naquela noite. Não só pelas estrelas, mas pelos seus semelhantes. Homens de virtude e esperança. Os olhos dos viajantes cintilaram enquanto se aproximavam das casas que os aguardavam. Entraram todos juntos na clareira com as provisões os seguindo, e pararam diante daquele que os havia visto primeiro, pois havia se adiantado, mais curioso que os demais. E mais seguro de si mesmo.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Outrora...

Se a criação deste Diário não houvesse sido tardia, talvez tivesse eu descrito a glória de meu palácio, a beleza de suas paredes intransponíveis, repletas de pinturas, confeccionadas por mãos outrora habilidosas, e mente um dia filosófica. Talvez pudessem presenciar a glória daquele chão de mármore por onde podia-se pisar sem desconforto, livre. O leito dourado à luz de velas, belo e revigorante. A doce música provinda dos cantos do próprio castelo, qual maravilha à luz de estrelas, luz única que um dia atravessou seus vitrais magníficos, sobrebos por si só. E quão perfeito não era o trono onde me recostava, observava, pensava e trabalhava, trabalhava em minha própria gratificação, sabendo que havia um lugar só meu o qual, acreditava eu em minha ingenuidade, nenhuma ação da inveja podia surtir efeito, e nenhum olhar de discórdia poderia abalar.

Pobre tolo. Quanto mais acreditava em minha glória e em minha subsistência, mais preparavam o ataque final, que me tiraria de minha própria casa, para vagar em torno dela enquanto fosse usurpada por aqueles que dela nunca necessitaram. Agora cá estou eu. As obras se foram junto com minhas mãos decepadas, a beleza se foi com meus olhos arrancados. O chão de mármore me foi roubado ao lado de meus pés e minha cama está em chamas, enquanto os últimos resquícios de minha sanidade se desvanecem com a memória de dias perfeitos.