Por duas noites seguidas eu tenho sonhado com a tua presença. com o recomeço daquilo que perdemos, com o acerto de contas e com o duplo entendimento da condição alheia. Com a vontade de permanências que nos impulsionam nos nossos caminhos. Na primeira, veio até mim. Na segunda, fui até ti. Nas duas, o conturbado metamorfoseou no tranquilo e o momento já-terminado morreu, esquecido fora do campo do aprendizado, e deu espaço a um novo início, livre das garras e amarras e cobranças do passado.
Por quê? Por mais que esta seja uma realidade que me traria alegria, não busco tais sonhos. Os sonhos sempre foram, para mim, um refúgio da realidade. Maldita realidade, que nos derruba em todas as chances que se apresentam e que nos empurra para baixo sempre que percebe um fraquejo. Agora, me atormentam da mesma forma que o esperar do próximo dia. Me mostram o que poderia ser.
Mas acordo e imediatamente percebo a realidade no meu entorno. O inferno parece cada vez mais vazio. A crise se manifesta em todos os planos; e os anjos descem ao abismo para buscar os demônios enquanto outros escalam as montanhas erebicas na esperança de alcançarem a luz ou na ilusão de alçarem voo mais uma vez com a ajuda de ventos mais fortes.
Talvez as profundezas não estejam tão mais vazias quanto desocupadas. São poucos os que não voltam. Eu mesmo voltei, mesmo que muito antes de abrir meus olhos para aceitar a falta de luz. Porém, errados somos nós que esquecemos de onde viemos e nos acostumamos com a contumaz clareza dos mundos geograficamente superiores, que enquanto nos querem se fazem onipresentes em nossas vidas.
O ódio sempre existiu e sempre existirá, mas hoje ele se direciona não para as unidades ou para os singulares, acostumados com tal forma de viver centrada no si, mas sim para as estruturas e para essa torre de existência que nos limita e nos engana. A morte dos céus não está na morte de seus integrantes, mas na derrubada de seus alicerces.
De toda forma, seria ela um anjo ou demônio adversário? Tanto faz. Os anjos já não são os mesmos e os demônios muito menos. Neste buraco abadônico, o que mais se busca é o passar dos dias e às vezes um lugar sobre as rochas ígneas onde o sono de Hypnos nos ajude a esquecer da morte constante. Subir a escada da existência, por aqui, é um processo individual. O fogo primordial não habita as profundezas anaeróbicas, mas também não pode existir na excessividade estratosférica. É preciso usarmos nossas asas não só para voar, mas primeiro para nos equilibrarmos na caminhada, pois elas ainda não estão prontas para a viagem. A escalada, hoje, se dá de forma menos heroica e menos unida, mas já é possível traçar os próprios trajetos e atravessar aqueles que no caminho do meu objetivo se estabelecem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário