Você vem rastejando de forma ritmada, ululante, fluida. Como uma serpente no escuro, sem começo e sem fim. Somente corpo. Sua aparência é enorme, como o tronco de uma árvore centenária que se move em homogeneidade e sufoca a mente com uma tamanha imposição trévida em meio ao corredor assombroso e de certa forma indefinido.
A luz é tão pouco que sinto como se estivesse observando uma foto; que se movimenta em tal, singular, destreza, que me confunde como que uma ilusão de ótica.
Ao ponto que percebo seus avanços, já é tarde demais. O peso sufoca qualquer semblante de esperança; e a fulgura de um campo amplo, ou de uma estrada infinita, se fecham em um instante. Instante este em que somos consumidos por uma prisão férrea e orgânica, acachapante e impositiva mas de forma além da compreensão ou da razão sórdida. É meramente intuitiva, parte essencial da humanidade. Um meio de defesa. Uma jaula não para me prender, mas para me segurar.
"Suas raízes se desprendem do chão conforme são macetadas e avacalhadas, avassaladas pelos dias, meses, anos e acontecimentos. Aqui eu te prendo, te enjaulo, te incorporo, te amasso e te assento novamente. Uma planta transplantada é preciso sê-la à força. Se o solo em que está é pobre, ou se passam por ela e a atacam a ponto de colocarem em risco a sua vida, é mais que necessário arrastá-la para onde esteja a salvo. E dali não tirá-la nem deixá-la se arrancar. É ali que ela se fincará novamente na fundação da Terra e apontará, ao mesmo passo, para os Céus e para os Infernos. Assim como em cima, também embaixo. Um sozinho é a morte. Os dois juntos, e tem uma vida."
De soslaio percebo, da única forma que consigo observar enquanto me afundo e me dou à força, e não à luz, que o movimento continua enquanto eu me absorvo em minha própria existência para mais uma vez me aterrar nas bases desse monumento deificante. Demiurgo, eu sou tanto aquele que é pisado e deformado quanto aquele que pisa e deforma. Sob meus próprios pés, sob meu corpo de serpente, eu me formo como avatar de mim mesmo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário