quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

Estereótipos e contradições - Devaneios óbvios

Enquanto eu ouvia música hoje, me peguei refletindo sobre algumas coisas. Lá vai: 

Engraçado como, ao mesmo tempo em que tentamos nos afastar de estereótipos, são eles que regulam grande parte das nossas vidas - mesmo se estivermos cientes, e tentarmos agir de forma consciente, quanto a eles. São transformados através de uma lógica ferramental, em que cada categoria de pessoa possui uma utilidade, papel ou capacidade. É óbvio que isto vem de tempos imemoriais, em que estes papéis eram considerados (e muitas vezes realmente eram) essenciais para a sobrevivência de cada grupo, mas as consequências destas associações se estendem até hoje através ou dos papéis antigos ou de cargos novos, reforçados pelas ideias antigas.

Para esta análise, vou me deter aos estereótipos de gênero.

Para a lógica social atual as mulheres são vistas (dentre outras coisas) como detentoras da beleza, e está claro que isto permeia o seu dia-a-dia em sociedade de forma perene. Quando nós homens olhamos para as mulheres, é esperado pela norma social que vejamos nelas encanto, gentileza, suavidade, fluidez, graciosidade, entre tantos outros adjetivos que explicam o significado da palavra beleza. Por mais que em uma análise rasa isto possa parecer algo bom (principalmente se a pessoa lendo for homem), o problema está na precisão desta visão: é só isto que se vê.

Não se vê a arte, a inteligência, o esforço, as dificuldades, a velocidade, a sagacidade, a força, a resiliência, a criatividade, nem nenhum outro atributo. Não de forma desassociada do conceito do que é belo. Tudo está sempre ligado ao corpo, e mesmo quando as elogiamos pelo que são e fazem, quase sempre atrelamos tal admiração à estética pessoal do ser, quase que (quando não exatamente) como forma de cortejo. O foco está na perpetuação da espécie. Na reprodução e na valorização dos descendentes. Por isso, também, que seus pensamentos são muitas vezes descartados ou acachapados em detrimento de sua aparência. Esta última já basta e muitas vezes é a única característica desejada pelo outro lado da moeda.

Já nós, os homens, sofremos muito menos desse tipo de análise. Talvez por termos sido - e sermos até hoje - os detentores do maior poder sobre ela própria. Porém, não estamos imunes. Como é difícil olhar para si mesmo e perceber tais coisas, já aceito que minha análise aqui talvez seja mais equivocada do que no primeiro caso. Porém, é visível que o papel do homem recai sobre o conceito de força.

Não sempre a força simples, baseada em músculos ou quantidade de carga. Mas sim na capacidade percebida para a violência. Os homens quase sempre tiveram o papel de defender o grupo e de garantir que as fontes de sobrevivência seriam asseguradas para os tempos que virão, por quaisquer meios fossem necessários. Por isto, precisava ser capaz de, e estar preparado para a, violência.

Já nos dias atuais, estes dois casos se tornam uma espécie de profecia autorrealizável, cuja existência já é suficiente para garantir sua realização. Porque hoje, por mais que o homem não precise ser o defensor da capacidade de sobrevivência e a mulher não precise ser o molde das futuras gerações, há diversas pesquisas que apontam que as pessoas mais atraentes são mais bem-sucedidas. As mulheres não precisam ter filhos nem cuidar das casas, e os homens não precisam caçar nem lutar contra outros homens, porém ainda assim as mulheres consideradas mais "belas" e os homens mais "intimidadores" costumam ter a vantagem. Tanto no âmbito social, quanto no empresarial, quanto no amoroso. A companhia das pessoas consideradas como modelos sempre se faz mais aprazível e vantajosa.

Ou seja, por mais que os motivos atuais sejam outros, um pouco mais distantes de tempos antigos, os resultados ainda são semelhantes e os estereótipos ainda se mantém. Por mais que lutamos contra eles diariamente, é nos nossos instintos que muitas vezes as raízes dessas crenças estão afirmadas.

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